O que está em jogo é a responsabilidade do que é escrito nos jornais, veiculado em rádios, televisão e internet
Andressa Brito (*)
Assistindo aos telejornais dos últimos dias, mais uma vez, escandalizou-me a forma descompromissada e sem foco com o que o Supremo Tribunal Federal tratou a questão da exigência ou não do diploma para exercer a função de jornalista. Não se trata de reserva de mercado, como apregoam alguns segmentos elitistas da comunicação ou de inibir a liberdade de expressão dos brasileiros como argumentou o presidente do STF, Gilmar Mendes. O que está em jogo é a responsabilidade do que é escrito nos jornais, veiculado em rádios, televisão e internet.
É claro, e talvez por ser claro demais ofusque a visão dos representantes da Suprema Corte, que o jornalista não lida com experimentações na busca por novos sabores e pratos, como fazem os cozinheiros cujo ofício foi comparado ao dos formadores de opinião. O jornalista lida com informações que podem ou não virar notícia e diretamente influencia sobre como uma sociedade enxerga determinada personalidade política ou instituição. Não estou com isso, compactuando com os que acreditam que a imprensa é o quarto poder, mas defendendo que deve-se ter ética e responsabilidade ao lidar com fatos que repercutem diariamente na vida de milhões de pessoas.
Não se pode voltar atrás do que foi dito ou escrito, por mais que nos valhamos de erratas e direitos de resposta. Por essa razão, é necessário apurar, checar, duvidar, questionar sempre com qual interesse as fontes nos passam fatos sigilosos, enfim, lançar mão de procedimentos que na faculdade podemos treinar sem causar danos. É a universidade o espaço destinado a reflexões, a internalizar preceitos éticos, a conhecer gente que enfrentou as adversidades, não se vendeu e marcou a história.
No mercado de trabalho, vamos adquirindo prática, dando formato jornalístico às informações, separando o que é importante do que não merece virar notícia. Até nessa seleção, o jornalista formado leva vantagem, ele sabe que sua atividade é tornar público o que melhora o cotidiano da sociedade, dá embasamento para suas escolhas, argumentos para suas discussões. É vocação, com certeza, mas tem que ser melhorada, aperfeiçoada, discutida, questionada. Não basta para ser jornalista ter apenas afinidade com a língua-mãe ou conhecimento das ciências humanas, senhores ministros.
A exigência de nível superior não impede ainda que “pensadores e intelectuais que trabalham de forma isenta” manifestem sua opinião, como alegou o ministro Ricardo Lewandowski. Embora todos que humildemente leram Carlos Chaparro, Nelson Traquina e tantos outros teóricos do jornalismo, saibam que isenção não existe. Em cada etapa, por sermos humanos, estamos deixando transparecer nosso conhecimento de mundo, o contexto no qual estamos inseridos e todas as nossas idiossincrasias. O que não tornam as notícias tendenciosas ou manipuláveis.
Significa assumir que não somos observadores da realidade, mas pertencemos a ela, e como jornalistas devemos ser fiéis, isso sim, ao que vemos, ao que ouvimos dos participantes de cada evento e ao que juramos na colação de grau. Na academia, ensinam-nos que ética e seriedade para informar são as maiores virtudes que um jornalista pode possuir e são condições sine qua non para o exercício da profissão. Apesar da analogia entre cozinheiros e jornalistas, espero que essa arbitrariedade não acabe em pizza!
(*) Andressa Brito é jornalista em Tocantins